quarta-feira, 12 de outubro de 2011

Algumas vezes escrevemos para que o que está dentro de nós não domine o nosso ser.
Algumas vezes escrevemos para entender o que se passa dentro de nós.
Algumas vezes escrevemos porque queremos perpetuar um momento, um sentimento, uma emoção.


MOMENTOS

Há algo dentro de mim
Que guardo tão seguro...
As paredes sobem
ou sou eu que junto os tijolos?
Minha imagem me reflete
mais intensa e menos o que sou
Palavras e sons
a perder de vista...
São só uma pequena parte de mim
Eu olho nos seus olhos... Silêncio...
Eu falo, eu grito
Eu peço, eu imploro
Eu sinto...
Prender-me, soltar-me...
História é socorro
Futuro é esperança...
Prisões do presente
Destroem-se paredes
e o vento circula...
Até o próximo muro
Até a próxima luta
Construir-me, destruir-me...
Não me diga o que fazer
Não me diga o que ser
Não me diga o que sentir
Me deixe ir...
Me solte!
Padrão que segura
Força que puxa
A mão que alivia
é a mesma que prende
Voar é uma questão de escolha...
Não me olhe assim
Não me julgue tão rápido
As feridas estão escondidas
porque voar...
É o Amor lidando com a Dor
E por que isso seria tão fácil?
Momentos, mudanças... Renovação
Paradigmas nascem para serem quebrados
Esse é o ciclo da vida...
Libertação e Poder
Como as ondas do mar...
Estar onde eu quero estar
Ser o que eu quero ser...
SEMPRE!


LIBERTAÇÃO

Se for ferido, é importante lembrar que as cicatrizes serão como luzes que impulsionarão suas vitórias.
A dor não precisa, necessariamente, tornar-se sofrimento.
Quando nos conformamos que a dor faz parte da Vida, passamos a julgá-la menos dolorosa, pois compreendemos que a Dor representará, sempre, a nossa Libertação.


"O" DIÁLOGO

GAROTINHA: Ei! Por que não deu certo?
VIDA: Porque você escolheu assim.
GAROTINHA: Mas eu não queria isso.
VIDA: Será?
GAROTINHA: Não, já disse que não!
VIDA: Quantas chances você teve de não fazer o que fez?
GAROTINHA: Mas o que eu fiz? Estava tudo sob controle. Pelo menos eu achava...
VIDA: Esse é o problema. Você quer controlar tudo, cada segundo e então...
GAROTINHA: E então?
VIDA: Você não vive! Fala aquilo que não quer falar, faz aquilo que não quer fazer... Mas sentir o que não quer sentir fica mais difícil, não é?
GAROTINHA: (pensativa) É...
VIDA: Pois é, agora não tem mais jeito. Está feito. O meu tempo não volta!
GAROTINHA: E isso que eu estou sentindo agora? O que eu faço com isso?
VIDA: Transforma...
GAROTINHA: Quê?
VIDA: Eu sigo em frente, dia após dia... Venha comigo e você perceberá que amanhã é um novo dia. Mude, tente algo diferente.
GAROTINHA: Nem sei por onde começar...
VIDA: Comece por você mesma! Busque-se, vasculhe-se, conheça-se, ame-se. Um amor que entende as próprias limitações, que aceita as próprias fraquezas. Liberte-se de conceitos pré-formados sobre si própria e então será mais fácil lidar com as pessoas, será mais tranquilo enfrentar os problemas, será mais importante viver-me, plenamente, agora!

sexta-feira, 19 de agosto de 2011

Dia do ator


O blog Batendo Texto deseja a todos os atores um lindo Dia do ator.
Um dia para pensarmos em questões que, latentes ou explícitas, colaboram ou prejudicam o nosso ofício.
É mais um dia para refletirmos sobre o nosso papel na sociedade e relembrarmos de quantos atores, diretores, dramaturgos, entre outros profissionais da comunicação, fizeram a diferença e abriram diversos caminhos para essa nova geração de atores.
Porém acredito que não basta apenas determos grande herança cultural se não fazemos uso dela.
É necessário que nossa geração, muitas vezes acomodada, aproprie-se de ensinamentos, porém sem usá-los como regras, mas sim explorando os novos caminhos que podem verter dessa imensa bagagem que nos foi regalada, aprimorando técnicas, descobrindo novas direções e gerando outras fontes, não deixando que muitos valores se percam pelo caminho.
"Atores, sejamos peneiras e não esponjas". (Larissa Landdim)
Questione, reivindique, informe-se, não absorva tudo aquilo que chega até você como se isto fosse lei.
Que também possamos pensar na amplitude de nossa profissão e quando nos sentirmos sozinhos e sem oportunidades, façamos dos nossos sonhos e projetos realidade.
Não fomos capacitados para esperar, esperar, sentados, deitados...
O exercício da nossa função não é ficar parado esperando que algo aconteça, mas sim transformar vida em arte.
É a profunda e intensa pesquisa diária, é praticar isso com paixão e coragem.
Então, atores, muita força para prosseguir e persistir neste árduo caminho.
A recompensa?
É o próprio caminho!

Para homenagear nossos queridos colegas de profissão finalizo com um texto que acho fantástico.

O ator, de Plínio Marcos

Por mais que as cruentas e inglórias
Batalhas do cotidiano
Tornem um homem duro ou cínico
O suficiente para fazê-lo indiferente
Às desgraças e alegrias coletivas,
Sempre haverá no seu coração,
Por minúsculo que seja,
Um recanto suave
Onde ele guarda ecos dos sons
De algum momento de amor já vivido.
Bendito seja
Quem souber dirigir-se
A esse homem
Que se deixou endurecer,
De forma a atingi-lo
No pequeno porém macio
Núcleo da sua sensibilidade.
E por aí despertá-lo,
Tirá-lo da apatia,
Essa grotesca
Forma de auto-destruição
A que por desencanto
Ou medo se sujeita.
E por aí inquietá-lo
E comovê-lo para
As lutas comuns da libertação.


O ator tem esse dom.

Ele tem o talento de atingir as pessoas
Nos pontos onde não existem defesas.
O ator, não o autor ou o diretor,
Tem esse dom.
Por isso o artista do teatro é o ator.
O público vai ao teatro por causa dele.
O autor e o diretor só são bons na medida
Em que dão margem a grandes interpretações.



Mas o ator deve se conscientizar
De que é um cristo da humanidade:
Seu talento é muito mais
Uma condenação do que uma dádiva.
Ele tem que saber que para ser
Um ator de verdade, vai ter que fazer
Mil e uma renúncias, mil e um sacrifícios.
É preciso coragem,
Muita humildade e, sobretudo,
Um transbordamento de amor fraterno
Para abdicar da própria personalidade
Em favor de seus personagens,
Com a única intenção de fazer
A sociedade entender
Que o ser humano não tem
Instintos e sensibilidades padronizados,
Como pretendem os hipócritas
Com seus códigos de ética.


Amo o ator
Nas suas alucinantes variações de humor,
Nas suas crises de euforia ou depressão.
Amo o ator no desespero de sua insegurança,
Quando ele, como viajor solitário,
Sem a bússola da fé ou da ideologia,
É obrigado a vagar pelos labirintos de sua mente
Procurando, no seu mais secreto íntimo,
Afinidades com as distorções de caráter
De seu personagem.


Amo o ator
Mais ainda quando,
Depois de tantos martírios,
Surge no palco com segurança,
Oferecendo seu corpo, sua voz,
Sua alma, sua sensibilidade
Para expor, sem nenhuma reserva,
Toda a fragilidade do ser humano
Reprimido, violentado.
Amo o ator por se emprestar inteiro
Para expor à platéia
Os aleijões da alma humana,
Com a única finalidade
De que o público
Se compreenda, se fortaleça
E caminhe no rumo
De um mundo melhor,
A ser construído
Pela harmonia e pelo amor.


Amo o ator
Consciente de que
A recompensa possível
Não é o dinheiro, nem o aplauso,
Mas a esperança de poder
Rir todos os risos
E chorar todos os prantos.
Amo o ator consciente de que,
No palco, cada palavra
E cada gesto são efêmeros,
Pois nada registra nem documenta
Sua grandeza.


Amo o ator e por ele amo o teatro.
Sei que é por ele que
O teatro é eterno
E jamais será superado
Por qualquer arte que
Se valha da técnica mecânica.






segunda-feira, 25 de julho de 2011

Memória Emotiva (parte 3)


II- Técnica para o ator- A arte da interpretação ética, Utta Hagen com Haskel Frankel

"Há professores que realmente forçam os atores a lidar com algo já enterrado (sua reação à morte do pai ou da mãe, ou ao trauma de um desastre). O resultado é histeria ou algo pior, o que, na minha opinião, é antiarte. Não estamos procurando psicoterapia. Se você se sente mentalmente doente ou perturbado e acha que precisa de psicoterapia, deve, sem dúvida, procurar um médico ou um terapeuta, não um professor de teatro."

"Quando digo que você deve ter distância em relação a experiência que deseja usar como ator, não estou me referindo ao tempo, mas à compreensão. Em 1938, tive uma experiência com a morte de alguém que eu amava profundamente, uma experiência que ainda não consigo superar por completo ou discutir, e que por isso não posso usar como atriz. No entanto, também tive uma experiência pela manhã que fui capaz de digerir e empregar à noite."

"As próprias ações, verbais ou físicas, podem gerar fortes emoções e às vezes ser tão estimulantes para uma descarga emocional como qualquer objeto interno relembrado. (Quando digo objeto interno, estou me referindo a um objeto não exteriormente presente, mas a um que existe e é representado apenas na mente.) O simples ato de bater meu punho na mesa pode provocar um sentimento de raiva. Uma razão ou motivação lógica para agir assim pode carregar a ação para mim. Uma motivada súplica por perdão, a ação física ou verbal de implorar, acariciar ou apertar podem produzir um rio de lágrimas. A ação de fazer cócegas suaves em alguém pode me fazer disparar um ataque de riso. Não estou recomendando que você adquira o hábito de predeterminar a expressão da ação a fim de encontrar a emoção, mas a sensação ou a emoção estão alimentando continuamente a ação, a qual, por sua vez, fomenta a emoção."

" A memória sensorial, a lembrança de sensações físicas, é freqüentemente mais fácil para o ator do que a lembrança das emoções. Se nós, como atores, temos males do ofício, um deles talvez seja a hipocondria. Nós, em grande parte, estamos interessados em nossas sensações e as examinamos, discutimos sobre elas e às vezes lhe damos mais importância do que talvez seja usual para alguém que não seja ator. Não há nada de errado nisso, contanto que lembremos que essas sensações podem ser expressas de maneira útil. Alguns atores são tão sensíveis e sugestionáveis que uma simples conversa sobre dor, calafrio ou coceira pode convencê-los de que têm aflição semelhante. Esses atores são exceção. A maioria de nós deve aprender a técnica correta de produzir sensações, de modo que estejam prontamente disponíveis para nós no palco.
Como o corpo tem um senso inato de verdade, devemos aprender alguns fatos fisiológicos para evitar a violação da verdade física. Às vezes, com um simples ajuste corporal incorreto, podemos destruir nossa fé numa sequência inteira de nossa existência no palco."

"Em suma, minha opinião é que um ator que esteja atuando corretamente deve, no plano ideal, ser a criatura mais saudável e menos neurótica do planeta, pois está usando sua vida sensorial e emotiva ao exprimi-la com um propósito artístico. Se ele está trabalhando no teatro, tem a oportunidade de fazer uso de suas ansiedades, hostilidades, ternura reprimida por meio da expressão artística. Acho que talvez as pessoas nos chamem de neuróticos, fúteis ou exibicionistas porque não sabem que muitos atores talentosos são assim apenas porque estão sem oportunidades de trabalho e, por isso, manifestam sua necessidade de expressão no álcool ou em condutas irracionais- ou talvez- porque essas pessoas tenham inveja de que, quando realmente atuamos, podemos fazer o que elas, quando muito, apenas sonham em fazer."

Memória Emotiva (parte 2)


Alguns trechos sobre Memória das emoções do livro "A preparação do ator", de Constantin Stanislavski.


"Dessas impressões, forma-se uma memória de sensações vasta, condensada, mais ampla e mais profunda de experiência correlata. É uma espécie de síntese da memória em grande escala. É mais pura, mais condensada, compacta, substancial e cortante do que os acontecimentos de fato."

"O tempo é um esplêndido filtro para os nossos sentimentos evocados. Além disto, é um grande artista. Ele não só purifica, mas também transmuta em poesia até mesmo as lembranças dolorosamente realistas."

"Você é capaz de imaginar como é realmente a nossa memória emocional? Imagine um certo número de casas, com muitos quartos em cada casa, em cada quarto inúmeros armários, prateleiras, caixas, e, em algum lugar, numa delas, uma pequena miçanga. É bem fácil achar a casa certa, o quarto, o armário, a prateleira. Mas já é mais difícil encontrar a caixa exata. E onde estará o olhar penetrante, capaz de descobrir aquela pequenina conta que se desprendeu hoje e rolou, por um momento lampejou e, depois, perdeu-se de vista? Só a sorte a encontrará de novo."

"Sempre e eternamente, quando estiverem em cena, você terá de interpretar a si mesmo. Mas isto será numa variedade infinita de combinações de objetivos e circunstâncias dadas que você terá preparado para o seu papel e que foram fundidos na fornalha da sua memória de emoções. É este o melhor e único material verdadeiro para a criatividade interior. Utilize-o e não confie em nenhuma outra fonte para abastecer-se."

"Outra razão por que devem apresar essas emoções repetidas é que um artista não constrói seu papel com a primeira coisa que lhe está à mão. Seleciona com o máximo de cuidado dentre suas lembranças e elege das experiências vivas as mais sedutoras. Para tecer a alma da pessoa que vai retratar, utiliza emoções que lhe são mais caras do que suas sensações cotidianas. Podem imaginar campo mais fértil para a inspiração? O artista torna o que de melhor existe nele e leva-o para o palco. A forma há de variar, conforme as necessidades da peça, mas as emoções humanas do artista permanecerão vivas e estas não podem ser substituídas por nenhuma outra coisa."

"Não sei. As coisas do subconsciente não são do meu terreno. Além disso, não creio que se deva destruir o mistério em que nos habituamos a envolver nossos momentos de inspiração. O mistério tem beleza própria e é, por si só, um grande estímulo à criatividade"

"Isso, entretanto, não deve levá-lo a concluir que tem o direito de subestimar a importância dos sentimentos repetidos, sacados na memória emocional. Pelo contrário, deve dedicar-se inteiramente a eles, pois são o único meio pelo qual poderá exercer qualquer grau de influência na inspiração. Permita-me recordar-lhes o nosso princípio cardeal: Por meios conscientes alcançamos o subconsciente."

"Nunca se perca no palco. Atue sempre em sua própria pessoa, como artista. Nunca se pode fugir de si mesmo. O instante em que você se perde no palco marca o ponto em que deixa de verdadeiramente viver seu papel e o início de uma atuação exagerada, falsa. Assim, por mais que atue, por mais papéis que interprete, nunca conceda a si mesmo uma exceção à regra de usar sempre os próprios sentimentos. Quebrar essa regra é o mesmo que matar a pessoa que você estiver interpretando, pois a estará privando de uma alma humana, viva, palpitante, que é a verdadeira fonte da vida do papel."

"Todas as nossas experiências criadoras são plenas e vivas na razão direta do poder, acuidade e exatidão da nossa memória. Se for fraca, os sentimentos que desperta serão pálidos, intangíveis e transparentes. Não têm valor, no palco, porque não conseguem ultrapassar a ribalta."

"Utilizamos como material criador não só as nossas próprias emoções passadas, mas, também, os sentimentos que experimentamos ao simpatizarmos com as emoções alheias."


Anexarei a este post o link do Arquivo confidencial do Faustão que a Cássia Kiss participou. Vi no facebook do meu amigo Eraldo Júnior e gostei de algumas colocações da atriz. Vale a pena conferir. =)

http://www.youtube.com/watch?v=_S67paevBL0&feature=watch_response

quarta-feira, 29 de junho de 2011

Memória emotiva



"Você acaso espera que um ator invente toda sorte de sensações novas ou até mesmo uma alma nova para cada papel que interpreta? Quantas almas teria de abrigar? Por outro lado, pode ele acaso arrancar fora sua própria alma e substituí-la por outra, alugada, por julgá-la mais adequada a determinado papel? Onde é que irá buscá-la? Podemos tomar de empréstimo roupas, um relógio, todas espécie de coisas, mas é impossível tomar de outra pessoa sentimentos. Os meus sentimentos são meus, inalienavelmente, e os seus lhe pertencem da mesma forma. É possível compreender um papel, simpatizar com a pessoa retratada e pôr-se no lugar dela, de modo a agir como essa pessoa agiria. Isso despertará no ator sentimentos análogos aos que o papel requer. Mas esses sentimentos pertencerão não à pessoa criada pelo autor da peça, mas ao próprio ator." (A preparação do ator, Constantin Stanislavski)

Eu sempre achei que não sabia usar minha Memória Emotiva em cena, até me dar conta da amplitude desta expressão criada por Stanislavski.
Quando preciso preparar uma cena tento relacionar a vida do personagem com a minha, buscando alguma semelhança no comportamento, ou em uma situação análoga que eu possa ter vivido.
Portanto, recorro à minha memória quando estou em processo de estudo da cena, porém quando interpreto não penso em nada que não tenha a ver com a minha personagem.
Eu achava que não usava a memória emotiva, pois enquanto faço a cena não penso em algo que aconteceu na minha vida particular, inclusive isso me desconcentra, eu simplesmente deixo a cena fluir...
Mas a memória emotiva está ligada à memória sensorial, uma instiga a outra e muitas vezes um olhar de desprezo, um beijo, um tapa na cara, um abraço, pode despertar a memória das emoções.
Em cena, esses momentos passam despercebidos, e as suas lembranças e sentimentos podem fundir com as do personagem em fração de segundos, e dissipar na ação seguinte do personagem.
Sentimentos e sensações surgem verdadeiramente em cena, significa que os estímulos em cena atuam não só sobre a personagem, mas antes sobre o ator.
Ou seja, a Memória emotiva está em ação!
Acredito que enquanto atuamos, não podemos ser completamente técnicos ou totalmente tomados por fortes emoções.
Mas será que nos momentos que somos técnicos estamos estimulando a memória das emoções/sensações e as usando em cena?
Quando usamos uma técnica de respiração para chegar a uma sensação ou emoção, por exemplo, estamos acessando intuitivamente a nossa memória das emoções/ sensações? O que fazer se durante uma cena vier à tona uma emoção equivocada que nos faz perder o controle das ações da personagem?
Ainda acho muito difícil ter o controle desta técnica, mas aos poucos descobrimos mais sobre nós mesmos e nossas emoções.
Em 2006, na apresentação da peça "Para quem não usa Ritalina", de Tom Dupin, eu interpretava a Soraia, uma garota sonhadora que era estuprada pelo seu patrão no final da peça. O estupro não acontecia, a cena se congelava no momento que o patrão de Soraia ia para cima dela e o foco continuava por aproximadamente 10 minutos em outra cena que acontecia no proscênio.
Ensaiei a peça durante 4 meses e aquela cena nunca me causou nenhum tipo de incômodo. Eis que no dia da estreia, durante a cena, eu começo a chorar compulsivamente. Consegui chorar sem fazer barulho. Sabe aquele choro que você abre a boca e quase perde o ar? rs Meu parceiro de cena, querido amigo Edson Gon, me dizia baixinho: fica calma, fica calma. Eu chorei até o final da peça.
Se eu te dissesse que me lembrei de alguma tristeza profunda da minha história de vida estaria mentindo. Eu não pensei em nada. Eu não me lembrei de nada. Acredito que a tensão da minha personagem continuou crescendo ao invés de congelar junto com a cena e foi estimulada pela sensação de sufoco e aprisionamento, pois a personagem do Gon estava em cima de mim. Aquela sensação se tornou uma emoção muito forte e ao mesmo tempo uma repulsa, mas não da atriz Carolina, e sim da personagem Soraia.
Houve uma outra vez que gravei um monólogo e um professor me aconselhou fazer uma substituição de circunstâncias. O monólogo era uma declaração de amor para um amigo, e tinha um trecho que a personagem dizia o seguinte: "Eu queria que você soubesse que mesmo que isso não dê em nada, já valeu. Já valeu a pena por tudo que eu experimentei assim, sozinha...Na solidão dos meus pensamentos, dos meus desejos". A ideia era fazer a declaração, mas com estímulos diferentes. Eu diria este texto pensando que o assunto era o meu amor não pelo meu amigo, mas sim pela arte, pela minha carreira. Eu faria o monólogo pensando o quanto era importante para mim estar ali e pensando na minha luta diária para conquistar o meu espaço. O resultado foi muito positivo. Quando eu chegava no trecho do texto que transcrevi há pouco, era a parte que eu mais me emocionava.
Este professor foi muito sensível ao perceber que isso seria algo que me emocionaria e ao mesmo tempo despertaria um sentimento similar ao que a cena pedia.
Acho que esses dois momentos na minha carreira tem muito a ver com o tema abordado neste post.
Ainda tenho diversas dúvidas sobre a prática de Memória Emotiva e Memória Sensorial, mas com as pesquisas, auto- análise e observação tudo começa a clarear e fazer sentido.
Ah! Acho importante ressaltar que reli o capítulo sobre Memória das Emoções do livro "A preparação do ator", de Stanislavski. Havia lido há 9 anos atrás e garanto que hoje em dia tudo faz muito mais sentido para mim.
Em paralelo li o livro do Renato Ferracini "A arte de não interpretar como poesia corpórea do ator" e o livro de Uta Hagen "Técnica para o ator. A arte da interpretação ética", ambos falam sobre Memória das emoções e Memórias das sensações.
Farei a parte 2 deste tema para que possamos rever conceitos que serviram de base e ponto de partida para os demais estudos sobre a arte de interpretar.

Se quiser fazer algum comentário, relatar alguma experiência profissional ou pessoal ou então partilhar informações, fique à vontade.

(A foto acima é de uma cena da peça "Para quem não usa Ritalina". Uma homenagem ao meu caro amigo Edson Gon, que presenciou um momento equivocado, mas muito importante da minha carreira. Que só hoje posso compreendê-lo e aceitá-lo como parte deste complexo processo de aprendizagem do ator).

terça-feira, 7 de junho de 2011

O céu é o limite!


Olá, queridos!
Já faz algum tempo que não postamos nada, eu sei, mas há alguns momentos na vida em que esse tempo é preciso.
E isso acontece por diversos motivos, ou porque precisamos digerir informações, refletirmos sobre conceitos, ou então por precisarmos avaliar determinados acontecimentos para decidirmos qual é o melhor caminho a trilhar.
Muitas vezes recebemos sinais que nos avisam quando o momento chega.
Sinais estes que podem surgir através de algum conselho, de uma intuição ou do seu próprio corpo pedindo socorro.
Eu respeito muito estes sinais, e já faz algum tempo que estou vivenciando um "intervalo".
(Juro, não era sobre isso que queria postar hoje, minha ideia era escrever sobre Memória Emotiva, estou lendo muitas coisas a respeito e me surgiram várias dúvidas que eu gostaria de dividir com vocês, mas acredito que essa justificativa é imprescindível para recomeçarmos, mesmo porque ela também é uma questão muito importante para estar em pauta hoje)
Meu corpo gritou, gritou e eu não quis ouvir e lutei contra seu pedido de socorro com todas as minhas forças. Mas ele foi mais forte do que eu. Fique "tonta". Sem chão. E caí.
Deitada no chão vi tudo girando sobre mim. De um ângulo que ainda não tinha visto.
Do lado de fora de todo aquele tornado, vi minhas angústias, meus anseios, minhas vontades, meus caprichos, meus sonhos, minhas dúvidas, minha criação, minha personagem, meus medos, meu LIMITE.
Sim, eu havia chegado ao meu limite.
É frustrante para qualquer ser humano perceber que não consegue ir além dos obstáculos da vida para chegar ao resultado que havia planejado, ou que ainda não é o momento para enfrentar determinadas provas.
E como funciona esse momento crucial na vida de um ator? Até onde devemos ir com a nossa "gula" por vivências? Devemos permitir que elas aconteçam naturalmente e assumir que não estamos prontos psicologicamente ou fisicamente para determinados personagens? Somos fracos por não nos aprofundarmos num universo que não temos o controle? Devemos perder o controle até achar o equilíbrio? Limitar-se é não dominar a técnica, ou não ter repertório suficiente de experiências vividas?

Estou lendo o livro "Técnica para o ator - A Arte da interpretação ética" de Uta Hagen com Haskel Frankel, tem um trecho que achei muito interessante, em que ela diz:
"Um jovem pianista talentoso, hábil na improvisação ou em tocar de ouvido, pode ser uma sensação passageira num night club ou na televisão, mas sabe que é melhor não tentar um concerto para piano de Beethoven. Os dedos do pianista simplesmente não conseguirão executá-lo. Um cantor pop com a voz destreinada pode ter sucesso semelhante, mas não com uma cantata de Bach, porque romperia as cordas vocais. Uma bailarina sem treino não tem esperança alguma de dançar em Giselle, pois romperia os tendões. Em sua tentativa, eles vão arruinar o concerto, a cantata e Giselle também para eles mesmos, pois se um dia finalmente estiverem preparados, só se lembrarão dos erros do passado. Mas um jovem ator, se tiver a oportunidade, vai mergulhar em Hamlet sem pensar duas vezes. Ele deve aprender que, enquanto não estiver pronto, está destruindo a si mesmo e ao papel."

Sei que esta não é uma verdade absoluta, pode até ser que existam atores geniais e prontos que não precisem de amadurecimento e técnica para atuar lindamente em "Hamlet" ou em qualquer outra grande obra, mas os dizeres de Uta me confortam perante a minha decisão. Não estou tranquila e relaxada quanto a isso. Pelo contrário. Mais do que nunca quero descobrir caminhos que me façam chegar ao domínio dessa técnica.
Talvez ter abdicado, com consciência, de algo tão importante para mim por saber que não estava pronta, já seja o início de um caminho rumo a autodescoberta.
Sem limites.
O céu é o limite!

terça-feira, 19 de abril de 2011

Quanto vale o seu sonho?


Pelos nossos sonhos
De quantas pessoas ainda teremos que abrir mão?
Quantas vezes mataremos um leão por dia?
Ou teremos um buraco no estômago e
um nó na garganta?

E NÃO,
pelos nossos sonhos,
não nos apeguemos aos "nãos"
senão eles farão o nosso sonho morrer

Pelos nossos sonhos
ainda seremos tomados diversas vezes pela saudade do colo maternal
Do ronco do pai
Das brigas de irmão
E muitas vezes, precisaremos estar lá, mas não estaremos
presenteando quem nos ama com a nossa ausência

Pelos nossos sonhos
O desespero baterá no coração diversas vezes e vamos pensar em desistir
Mas lembraremos de tudo o que o nosso sonho nos custou
e vamos perceber que essa aflição não nos levará a nada
Sendo assim, continuaremos perseverando

Muitas pessoas tentarão acabar com a nossa fé e partirão o nosso coração
Perdoemos.
Pois por algum motivo essas pessoas tiveram que abrir mão dos seus sonhos
E não há nada que torne uma pessoa mais amarga do que ter deixado pelo caminho desejos, vontades, ideais

Mas também vamos cruzar com tanta gente que está no mesmo barco
Que vamos nos dar conta de que não somos os únicos a pelejar pelos percalços desta dura trajetória
E pelos nossos sonhos vamos nos perguntar: Qual será o preço que eles pagaram pelos seus sonhos?
Muitos tiveram de se abster da estabilidade profissional
Alguns tiveram que abrir mão do seu maior bem
Material ou afetivo
Outros encontraram imensa alegria morando num quarto de pensão
mesmo que a solidão fosse sua companheira mais frequente
Mas eles diriam que valeu a pena
pois foram movidos por aquele mágico material de que são feitos os sonhos
Pois é esse material mágico que movimenta nossos órgãos vitais
E ele é contagiante, passa de um para o outro, como uma virose

Estar entre esses sonhadores nos impulsionará ainda mais até o nosso objetivo
E teremos a certeza de que não estamos sozinhos

Existem milhares de sonhadores pelo mundo
A cada dia um deles saem do seu estado de conforto e conformismo
fazendo uma escolha árdua
Abrindo mão das oportunidades que estão ao seu alcance
para trilhar caminhos que nunca foram desbravados
Eles, assim como nós, também são compostos do mesmo material dos sonhos
Eles também pagaram um preço alto para levar adiante seus ideais

Pensemos nesses sonhadores,
Pensemos naqueles que chegaram lá
Sejamos i-na-ba-lá-veis pelos nossos sonhos!

Pelos nossos sonhos...
Pensemos em tudo o que deixamos para trás
Não deixemos que o desânimo nos impeça de continuar
E não nos esqueçamos que a dignidade com a qual chegamos até os nossos sonhos será o seu alimento futuro.

Pelos nossos sonhos...
Temos o dever de sonhar.


“ Eu tenho uma espécie de dever, dever de sonhar, de sonhar sempre,
pois sendo mais do que um espetáculo de mim mesmo,
eu tenho que ter o melhor espetáculo que posso.
E, assim, me construo a ouro e sedas, em salas
supostas, invento palco, cenário para viver o meu sonho
entre luzes brandas e músicas invisíveis.” (Fernando Pessoa)

segunda-feira, 28 de março de 2011

AUTOCONHECIMENTO


Eita tarefa difícil essa, hein?!!?

O autoconhecimento é muito importante para qualquer ser humano, porém é essencial para um ator. Mas como fazer isso? Por onde começar?
Cada um tem o seu processo e isso é muito particular, mas a terapia, seja individual ou em grupo, na maioria das vezes é imprescindível.

Quando a gente vai se conhecendo, percebemos que é um processo doloroso e até mesmo sombrio, porém muito gratificante. Isso porque na sociedade em que vivemos, temos que ser “normais”. E o que é ser normal? Tudo que foge ao senso comum, tudo que fazemos e é considerado fora das convenções sociais é tachado como atitude Anormal, incorreta, estranha. Mas o que é errado? Porque errar não é permitido? “Bom mesmo é aquele que sabe tudo, acerta tudo”. Sabe tudo o que?
Somos educados a nos penitenciar por qualquer conduta fora do normal, do convencional. Essa ditadura do “normal” impede com que nós enxerguemos que surpreender é muito interessante e que errar é essencial para o crescimento de alguém. Dificilmente crescemos e aprendemos quando estamos felizes e tudo dá certo na vida. O sofrimento e o erro são os combustíveis necessários para que nós voltemos a prestar atenção em nós mesmos, é a oportunidade que temos de nos conhecer melhor, de encontrar algo jamais acessado anteriormente.
Ninguém é “normal”, somos muito complexos. Entretanto nos fazemos quase que iguais em atitudes e condutas. Temos medo de acessar parte de nosso inconsciente, temos receio de encarar o nosso outro lado, o qual está ali nos mostrando que sim, somos capazes de tudo. Porém, se nos permitirmos acessar, adquirindo essa consciência, teremos maior controle sobre nós mesmos, conviveríamos melhor com as diferenças e julgaríamos menos os outros.

Quando Murray Stein escreve sobre personas e sombras a partir da literatura de Jung, nos faz repensar quem somos e a imagem que queremos passar de nós mesmos:
“A maioria das pessoas vêem-se como decentes e conduzem-se de acordo com as regras da decência e da correção em seus círculos sociais, e só revelam elementos sombrios por acidentes, em sonhos ou quando impelidas a extremos. Para elas, o lado sombrio do ego ainda funciona, mas através do inconsciente, manipulando o meio ambiente e a psique para que certas intenções e necessidades sejam satisfeitas de um modo socialmente aceitável. O que o ego quer na sombra, entretanto, não é necessariamente mau em si e de si e, com frequência, a sombra, uma vez enfrentada, não é tão perversa quanto se imaginou.” (STEIN, 1998, p. 99)

Acredito que nós atores temos a obrigação de acessar a sombra, trazendo para a consciência elementos e sentimentos que nos abram possibilidades, que nos permitam viver a história de um personagem com verdade, mapeando as sensações no corpo, através da união de pensamento e estado físico, e assim perder o controle do “como vai chegar”, somente tendo consciência de “onde vai chegar”.

Artistas convivem muito mais do que em qualquer outra profissão com os jogos do ego. Aplausos, elogios, reportagens, fãs, etc. É difícil, não estou aqui pra dizer como é fácil ou como eu consigo fazer de outro jeito. Não, é realmente muito difícil ter a consciência de que aquele elogio não me torna um ator melhor, que os aplausos são um reconhecimento maravilhoso, mas, provavelmente, não me ajudarão no meu próximo trabalho, pelo contrário, pode ser que me atrapalhe e infle meu ego a tal ponto que, mesmo sabendo que o trabalho de ator é contínuo e incessante, eu me coloque em uma zona de conforto perigosa.

Indicação de livro: Técnica para o ator: A arte da interpretação ética (Uta Hagen)
Agradecimento: Cintia Di Giorgi e grupo de estudos.

sexta-feira, 4 de março de 2011

Conselhos do mestre Rilke. Conselhos do mestre Leal.


"Ser artista não significa calcular e contar, mas sim amadurecer como a árvore que não apressa a sua seiva e enfrenta tranquila as tempestades da primavera, sem medo de que depois dela não venha nenhum verão. O verão há de vir. Mas virá só para os pacientes, que aguardam num grande silêncio intrépido como se diante deles estivesse a eternidade". (Rilke)

Este episódio que gostaria de contar hoje, aconteceu há mais ou menos um mês, numa tarde de quinta-feira, a caminho do ensaio.

Aquele havia sido um dia estranho, cheio de questionamentos, aflições e desânimo. Toda essa agonia se devia mais uma vez ao caminho que escolhi trilhar, à profissão que escolhi para minha vida.

Nunca tive dúvidas sobre minha escolha, esta já está resolvida desde que me conheço por gente. Mas às vezes somos tomados por uma crise existencial que nos leva a refletir e perguntar se estamos no caminho certo.

Voltando ao acontecido...

Tive um professor que para mim, é um verdadeiro mestre. Fernando Leal. Ele é diretor de cinema e me deu aula de interpretação para TV e Cinema. Sabe aquele tipo de pessoa que fala ao seu coração? Que chega até sua alma? Que instiga seu espírito? Então, estes são os efeitos que ele causa em mim.
Muito do meu amadurecimento profissional se deve ao incrível trabalho que ele desenvolve.

Já fazia algum tempo que eu vinha sonhando com o Fernando, sonhava que estava em seu curso, ouvindo suas palestras e sentia que deveria fazer-lhe uma visita. Pois é, naquela quinta-feira eu me encontrava nos arredores da rua onde se localiza seu curso. Então fui açoitada por uma forte vontade de reencontrá-lo e quando vi já estava lá. Eu tinha apenas 15 minutos, mas fui movida por um impulso instintivo, havia algo em mim que falava mais alto, era como se eu precisasse de um alimento para a alma e só em suas palavras pudesse encontrar.

Posso garantir que senti meu coração palpitar enquanto ia ao seu encontro. Foi quando ele surgiu no corredor, com seu jeito descontraído, disse: - Cardinale?! - Abracei forte meu mestre e percebi que ele estava um pouco ocupado, mas mesmo assim foi simpático e receptivo, pedindo que eu o aguardasse em uma das mesas da lanchonete que fica abaixo de seu escritório. Eu tinha apenas 10 minutos e sentei-me, pois sabia que não tomaria muito do seu tempo. Depois de uma breve ligação ele se sentou e disse: - Que bom te ver, Cardinale! Você parece estar feliz!
Cardinale: - Ah sim, estou bem. Estou em um grupo de teatro, ensaiando as peças simbolistas de Ibsen...

Fiz um breve resumo do que se passava na minha vida profissional. Ele achou bacana e acho que até se surpreendeu com as novidades.
Sim, eu estava feliz, mas ao mesmo tempo sentia-me um pouco perdida. Sentia um vazio, uma insegurança e indecisão. Precisava de um conselho, um caminho, uma orientação, e achei que ele pudesse me ajudar com isso.
Disse-lhe que seu curso havia sido muito importante para mim, e que mesmo depois de 2 anos e meio ainda caíam fichas do que ele nos disse em aula.

Cardinale: - Mas sabe Fernando, há dias que acerto em cheio e outros que erro feio. Muitas vezes me pergunto se realmente estou no caminho.

"Com efeito, em última análise, é precisamente nas coisas mais profundas e importantes que estamos indizivelmente sós, e para que um possa aconselhar ou mesmo ajudar o outro, muito deve acontecer; muitos sucessos favoráveis devem ocorrer; toda uma constelação de eventos se deve reunir para que uma única vez se alcance um resultado feliz". (Rilke)

O que escreverei a seguir foi aquilo que absorvi do discurso de Fernando Leal.
Ele disse que isso me aconteceria diversas vezes, pois eu era muito nova. Relembrou que na época em que estava no grupo do Antunes Filho também não compreendia muito do que ele dizia, e que muitas fichas só caíram 20 anos depois. O amadurecimento é a chave para a compreensão desse complexo processo de aprendizado do ator.

“Deixar amadurecer inteiramente, no âmago de si, nas trevas do indizível e do inconsciente, do inacessível a seu próprio intelecto, cada impressão e cada germe de sentimento, e aguardar com profunda humildade e paciência a hora do parto de uma nova claridade: só isso é viver artisticamente na compreensão e não criação”. (Rilke)

Por fim me disse para que eu não me importasse com aquilo que os outros pensavam a respeito dos meus equívocos, pois um erro poderia ser melhor que um acerto para minha evolução como atriz.

" O senhor está olhando para fora, e é justamente o que menos deveria fazer neste momento. Ninguém o pode aconselhar ou ajudar- ninguém. Não há senão um caminho. Procure entrar em si mesmo. Investigue o motivo que o manda escrever; examine se estende suas raízes pelos cantos mais profundos de sua alma; confesse a si mesmo: morreria, se lhe fosse vedado escrever? Isto, acima de tudo, pergunte a si mesmo na hora mais tranquila de sua noite: " Sou mesmo forçado a escrever? ". Escave dentro de si uma resposta profunda. Se for afirmativa, se puder contestar àquela pergunta severa por um forte e simples "sou", então construa sua vida de acordo com essa necessidade". (Rilke)

E frisou que mesmo se só depois de mais dez anos na estrada eu achar que não devo seguir a profissão, ainda assim, a minha busca não terá sido em vão.

" Mas talvez se dê o caso de, após essa descida em si mesmo e em seu âmago solitário, ter o senhor de renunciar a se tornar poeta. (Basta, como já disse, sentir que se poderia viver sem escrever para não mais se ter o direito de fazê-lo.) Mesmo assim, o exame de consciência que lhe peço não terá sido inútil. Sua vida a partir desse momento, há de encontrar caminhos próprios. Que sejam bons, ricos e largos é o que lhe desejo, muito mais do que posso exprimir". (Rilke)

Também me indicou o livro: Cartas a um jovem poeta, de Rainer Maria Rilke.
Um pouco antes da despedida, colocou a mão no meu ombro, e disse: Você está no caminho, boto fé em você!
Dei um forte abraço nele e agradeci por tudo.

Algumas pessoas não imaginam o quanto são importantes em nossas vidas e muito menos tem noção da diferença que uma conversa de 10 minutos pode fazer em nosso íntimo.
Aqueles dez minutos foram como um novo fôlego na minha trajetória profissional. Ele me fez perceber que é preciso olhar para dentro, pois as respostas estão em nós mesmos.

Saí daquele encontro muito emocionada e também muito confiante de que estava no caminho certo. Talvez não para os outros, mas para mim mesma.
O que realmente importa é que eu continuo nessa busca incessante, e a cada dia descubro algo novo a meu respeito, e isso só depende de mim.

"Cartas a um jovem poeta" é um livro que todo jovem precisaria ler, principalmente o jovem artista. É uma obra que elucida a mente despertando-nos para a auto- análise e o autoconhecimento.

Agradeço a indicação e os conselhos, mestre.

Conselhos do mestre Rilke.
Conselhos do mestre Leal.

quinta-feira, 24 de fevereiro de 2011

Inspire e Expire!


Hoje, ao acordar, senti que precisava RESPIRAR.

Mas não respiramos o tempo todo? Involuntariamente? Inconscientemente?

Sim, mas hoje eu quero explorar as possibilidades do meu pulmão, diafragma e vias aéreas.

“O que a respiração voluntária provoca é uma reaparição espontânea da vida.” (Artaud)

Sim, é disso que eu preciso! Vida! Então... mexa-se!

Arrastei os móveis da sala e passei um pano no chão para tirar a poeira (eu sei, o meu TOC não vem ao caso).

Quando o piso secou, me deitei, e primeiramente tentei alinhar a minha coluna, relembrando da lição de casa que a fisioterapeuta sempre me recomendou.

A partir dos princípios da RPG, trabalhei a respiração concomitante ao alongamento da coluna.

Endireitava o pescoço, alongava os braços e as pernas. Sustentava o corpo no abdômen, concentrando energia e tônus em seus músculos. Respirava suavemente. Chegou um momento que achei que a minha coluna estava alinhada ao chão. Comecei então a brincar com a respiração e o diafragma. Fracionava inspiração em expiração em tempos diferentes. Inspirava em 10 segundos e expirava em 10. Inspirava em dois segundos e expirava em dois, inspirava em dois segundos e expirava em seis, enfim, experimentei diversas frações. Uma “sequência” me deixava calma, outra me incitava ao nervosismo, algumas vezes me senti agoniada e até agonizante, e ainda tinha aquela que me deixava triste e aquela outra que me dava sono...

“A respiração acompanha o sentimento e pode-se penetrar no sentimento pela respiração, sob a condição de saber discriminar, entre as respirações, aquela que convém a esse sentimento.” (Artaud)

Um susto, uma paixão, a decepção, o sono, o medo, a agonia, a felicidade, dentre outros sentimentos, interferem na nossa respiração e pulsação. Mas essa interferência também pode ser voluntária e permite que cheguemos a diferentes emoções. Acessar o físico para chegar lá. Você já experimentou em alguma cena que fez? O que funciona melhor para cada ator? Não é uma regra, mas pode ser um caminho muito interessante para o ator alcançar seu objetivo em cena.

“Alcançar as paixões através de suas forças em vez de considerá-las como puras abstrações confere ao ator um domínio que o iguala a um verdadeiro curandeiro. Saber que existe uma saída corporal para a alma permite alcançar essa alma num sentido inverso e reencontrar o seu ser através de uma espécie de analogias matemáticas”. (Artaud)

O corpo humano é um instrumento de trabalho para nós atores, uma máquina complexa e perfeita em seu funcionamento, imprescindível para o ofício do ator. Que tal nos embrenharmos por esses misteriosos sistemas que nos compõem? Que tal sentir a pulsação de cada órgão? Buscar a origem de cada arrepio e frio na barriga?

É uma tarefa difícil e corajosa, então, antes de começar, inspire... e expire.


*Dica de leitura: Um atletismo afetivo. Capítulo do livro: O ator e seu duplo (Antonin Artaud)

domingo, 20 de fevereiro de 2011

A complexidade da mente


É incrível como uma obra de arte é capaz de mexer tanto conosco, basta estar aberto para recebê-la.

Cada pessoa absorve um discurso a sua maneira. Mesmo que este tenha um objetivo muito bem definido, a subjetividade de quem o recebe (completamente peculiar) é que ditará seu caminho.

As luzes se acenderam e ninguém levantava da cadeira. Perplexos, chocados... Tomados por algo talvez ainda inexplicável, mas que de alguma forma se faria apreender posteriormente (ao menos para mim).

Dormir? Talvez tenha sido uma das noites menos dormidas, entretanto uma das mais instigantes. O caminho espetacular de uma atriz que tirou meu sono, despertando sensações e descobertas que ainda necessitam ser trabalhadas por mim.

O que significa para um artista atingir a perfeição? Quem sabe se deixar tomar pelas emoções, instintos, se embebedando daquele mundo, daquela vida... Será esta uma busca arriscada, cheia de fantasmas que talvez ainda não estejamos preparados para enfrentar?

Nossos cérebros guardam segredos de nós mesmos e decidem apresentá-los quando bem lhes provem ou talvez quando imploramos por algo mesmo sem percebermos.

O que me move? O que te move? A cada pequena ação temos um objetivo interior, algo que nos movimenta, nos faz sair da zona de conforto, faz agir. A busca por este movimento interior, este preenchimento é que faz com que o ator sinta, naquele momento, que a sua vida é a vida daquele papel.

A imaginação - trazendo o ator criador -, assim como a entrega - permitindo-se - e a abstração - quando já doamos nosso corpo àquela outra vida, àquela outra história - (Constantin Stanislavski) precisam atuar em conjunto para que a interpretação e o olhar passem a verdade necessária.

Acho interessante destacar que quando trabalhamos desta forma com a mente é importante que a razão e a emoção estejam em harmonia. A vontade humana é racional e o desejo emocional, portanto o equilíbrio e o trabalho em cooperação evitam uma entrega sem verdade e também aquela em que o ator não tenha o controle sobre si próprio.

Como saber se estamos preparados para aquele personagem? Possuímos a estrutura necessária para equilibrar tudo que foi dito até agora?

Ainda não sei a resposta. Quem sabe batendo o texto a gente tenha algumas sugestões e percepções.

As únicas coisas de que tenho certeza são que talento sem disciplina e determinação é um ator em estado bruto e que o propósito interior está presente nos nossos cinco sentidos, fazendo dos olhos o espelho da alma.

quinta-feira, 17 de fevereiro de 2011

Entre Vertigens e Ibsen


Há um pouco mais de um semestre estou em um grupo de teatro estudando as peças simbolistas de Ibsen.

Os ensaios começaram há duas semanas e estamos pesquisando partituras de movimentos e aplicando-as em algumas cenas, que preparamos para apresentar ao grupo.

Cimos, fiordes, picos, topos, sótãos e altas construções. É nesse tipo de “relevo” ou “arquitetura” que os protagonistas de Ibsen transitam.

E nós, os atores, pesquisamos e utilizamos signos e símbolos para expressarmos essa ascensão e declínio dos personagens.

Solness, um dos protagonistas, é um construtor, faz grandes igrejas, mas tem medo de altura. Pois é, há uma semana estou em contato com este protagonista e pesquiso uma cena para apresentar.

Vejam a minha situação: logo eu, que nunca tive medo de altura, que sempre me aventurei pelos brinquedos mais altos do parque de diversão, que sempre quis pular de asa delta e que adoro morar no 15º andar, cá estou, com uma labirintite mestra, de molho, em casa, por causa de tamanha vertigem.

Solness e eu.

Será possível? Sempre consegui manter distância dos personagens, chorava com suas lágrimas, depois cessava. Ria com o seu riso e logo depois ficava séria. Coachava, Engrossava, Latia, Afinava, Cacarejava, Hablava... E depois tudo passava. Simples assim. Sem envolvimento...

E agora me encontro nesse estado, volta e meia grito achando que vou cair. Se eu levanto, tenho que sentar, se sento tenho que deitar e quando deito tudo roda.

CULPA DO SOLNESS, CULPA DO IBSEN.

Cadê meu “eixo” diretor? O tal eixo que “exercitamos” tanto na semana passada. Sentia-me livre para cair, pois sabia levantar (que bonito isso).

Solness está ao meu lado, esperando a Hilde provocante, a Hilde que o instiga a subir em suas construções. Ele gargalha da minha cara em letras garrafais, HAHAHA, e diz: “Logo você que recitava as falas de Hilde com tanta propriedade e nas alturas!” Pois é, eu sei, logo eu, que estava feliz porque faria a intrigante Hilde... Agora olho a minha imagem tortuosa no espelho e me vejo Solness.

Será possível que meu organismo tenha absorvido esse universo todo? Não estou falando de emoção! Não! Não é emoção. Não tenho vontade de rir, de chorar, de soluçar, não tremo, não me deprimo... São apenas tonturas, vertigens, vertigens de Ibsen.

A cada palavra digitada a visão fica embaralhada e depois volta ao normal. Quando olho para frente três homens me observam, em primeiro plano Ibsen e Solness e em segundo plano Artaud, sim o próprio, e ainda por cima (não muito em cima senão caio) eles tem um meio sorriso um tanto irônico no rosto.

Ai!

Além disso, (como pude esquecer de dizer isso?) ainda tem o Artaud de pano de fundo!
O livro “O ator e seu duplo” zomba de mim. Vai entender por qual razão não consigo chegar ao capítulo do Teatro da Crueldade. Já li duas vezes o livro até este capítulo e quando chego lááá (Pausa) não consigo continuar.
Perdi meus óculos e troco as palavras, as tonturas também deformam as palavras, mas Artaud, para quê palavras?

Estou sentindo, meu filho, sentindo!

O que acho interessante é todo esse estado físico... É orgânico! É como se meu corpo tivesse absorvido Solness, Ibsen, Artaud. E o resultado disso é a LABIRINTITE.

Nesse labirinto de peças, teorias, partituras e símbolos eu me encontro rodando, olho para tudo isso e caio gritando de susto. Assustada por ver o mundo girar, Assustada por nada estar ao meu controle.

Tomo então a minha pílula de “eixo” e finalizo o retrato das impressões de um processo fantástico de uma atriz em pesquisa.

segunda-feira, 7 de fevereiro de 2011

Então, me dá a deixa!

"Bater o texto" é um termo usado por atores para estudar o texto com o outro ator que está envolvido na cena. Dois atores ou mais lêem o texto para decorar as falas de seus respectivos personagens. Um ator chega em um teste e o produtor, diz: -Você fará a cena com Fulano! O ator que está com o texto em mãos, diz: Fulano, vamos bater o texto?

Iniciamos o blog com o intuito de "bater texto", porém no sentido mais amplo do termo, pretendemos analisar trechos de livros, relacionar teóricos de teatro, dialogar através de poemas e poetas, destacar falas da dramaturgia mundial, discutir o universo de dramaturgos e expor as nossas próprias ideias e teorias. Este conteúdo estará intrinsecamente ligado ao "mundo" do ator.

Todos os dias me deparo com atores. Atores que trabalham no teatro, televisão, cinema, ou então, atores que transitam por todos esses segmentos, e percebo que muitas são as aflições, dúvidas e teorias de cada um. Pois é... pode ter certeza de que estamos no mesmo barco. Então este é um espaço para trocarmos experiências.

Todas as críticas, opiniões, propostas de temas e discussões serão muito bem-vindas!

Nosso blog abre as portas não só para atores, mas para todos os comunicadores interessados em partilhar conhecimentos e informações.

Ensaiamos "um bocado" para iniciar o blog, pois os caminhos são muitos e nos confundem de tal forma, que não conseguimos organizar os pensamentos. Mas acredito que chega um momento que é necessário "se jogar", mesmo que seja assim, no susto, pois nunca estamos plenamente prontos, há sempre algo para mudar e aperfeiçoar. Aos poucos as ideias vão fluindo e se organizam na prática.
Este é apenas o início de tudo.
Que tal batermos o texto antes que as cortinas se abram?
Então, me dá a deixa?