quinta-feira, 24 de fevereiro de 2011

Inspire e Expire!


Hoje, ao acordar, senti que precisava RESPIRAR.

Mas não respiramos o tempo todo? Involuntariamente? Inconscientemente?

Sim, mas hoje eu quero explorar as possibilidades do meu pulmão, diafragma e vias aéreas.

“O que a respiração voluntária provoca é uma reaparição espontânea da vida.” (Artaud)

Sim, é disso que eu preciso! Vida! Então... mexa-se!

Arrastei os móveis da sala e passei um pano no chão para tirar a poeira (eu sei, o meu TOC não vem ao caso).

Quando o piso secou, me deitei, e primeiramente tentei alinhar a minha coluna, relembrando da lição de casa que a fisioterapeuta sempre me recomendou.

A partir dos princípios da RPG, trabalhei a respiração concomitante ao alongamento da coluna.

Endireitava o pescoço, alongava os braços e as pernas. Sustentava o corpo no abdômen, concentrando energia e tônus em seus músculos. Respirava suavemente. Chegou um momento que achei que a minha coluna estava alinhada ao chão. Comecei então a brincar com a respiração e o diafragma. Fracionava inspiração em expiração em tempos diferentes. Inspirava em 10 segundos e expirava em 10. Inspirava em dois segundos e expirava em dois, inspirava em dois segundos e expirava em seis, enfim, experimentei diversas frações. Uma “sequência” me deixava calma, outra me incitava ao nervosismo, algumas vezes me senti agoniada e até agonizante, e ainda tinha aquela que me deixava triste e aquela outra que me dava sono...

“A respiração acompanha o sentimento e pode-se penetrar no sentimento pela respiração, sob a condição de saber discriminar, entre as respirações, aquela que convém a esse sentimento.” (Artaud)

Um susto, uma paixão, a decepção, o sono, o medo, a agonia, a felicidade, dentre outros sentimentos, interferem na nossa respiração e pulsação. Mas essa interferência também pode ser voluntária e permite que cheguemos a diferentes emoções. Acessar o físico para chegar lá. Você já experimentou em alguma cena que fez? O que funciona melhor para cada ator? Não é uma regra, mas pode ser um caminho muito interessante para o ator alcançar seu objetivo em cena.

“Alcançar as paixões através de suas forças em vez de considerá-las como puras abstrações confere ao ator um domínio que o iguala a um verdadeiro curandeiro. Saber que existe uma saída corporal para a alma permite alcançar essa alma num sentido inverso e reencontrar o seu ser através de uma espécie de analogias matemáticas”. (Artaud)

O corpo humano é um instrumento de trabalho para nós atores, uma máquina complexa e perfeita em seu funcionamento, imprescindível para o ofício do ator. Que tal nos embrenharmos por esses misteriosos sistemas que nos compõem? Que tal sentir a pulsação de cada órgão? Buscar a origem de cada arrepio e frio na barriga?

É uma tarefa difícil e corajosa, então, antes de começar, inspire... e expire.


*Dica de leitura: Um atletismo afetivo. Capítulo do livro: O ator e seu duplo (Antonin Artaud)

domingo, 20 de fevereiro de 2011

A complexidade da mente


É incrível como uma obra de arte é capaz de mexer tanto conosco, basta estar aberto para recebê-la.

Cada pessoa absorve um discurso a sua maneira. Mesmo que este tenha um objetivo muito bem definido, a subjetividade de quem o recebe (completamente peculiar) é que ditará seu caminho.

As luzes se acenderam e ninguém levantava da cadeira. Perplexos, chocados... Tomados por algo talvez ainda inexplicável, mas que de alguma forma se faria apreender posteriormente (ao menos para mim).

Dormir? Talvez tenha sido uma das noites menos dormidas, entretanto uma das mais instigantes. O caminho espetacular de uma atriz que tirou meu sono, despertando sensações e descobertas que ainda necessitam ser trabalhadas por mim.

O que significa para um artista atingir a perfeição? Quem sabe se deixar tomar pelas emoções, instintos, se embebedando daquele mundo, daquela vida... Será esta uma busca arriscada, cheia de fantasmas que talvez ainda não estejamos preparados para enfrentar?

Nossos cérebros guardam segredos de nós mesmos e decidem apresentá-los quando bem lhes provem ou talvez quando imploramos por algo mesmo sem percebermos.

O que me move? O que te move? A cada pequena ação temos um objetivo interior, algo que nos movimenta, nos faz sair da zona de conforto, faz agir. A busca por este movimento interior, este preenchimento é que faz com que o ator sinta, naquele momento, que a sua vida é a vida daquele papel.

A imaginação - trazendo o ator criador -, assim como a entrega - permitindo-se - e a abstração - quando já doamos nosso corpo àquela outra vida, àquela outra história - (Constantin Stanislavski) precisam atuar em conjunto para que a interpretação e o olhar passem a verdade necessária.

Acho interessante destacar que quando trabalhamos desta forma com a mente é importante que a razão e a emoção estejam em harmonia. A vontade humana é racional e o desejo emocional, portanto o equilíbrio e o trabalho em cooperação evitam uma entrega sem verdade e também aquela em que o ator não tenha o controle sobre si próprio.

Como saber se estamos preparados para aquele personagem? Possuímos a estrutura necessária para equilibrar tudo que foi dito até agora?

Ainda não sei a resposta. Quem sabe batendo o texto a gente tenha algumas sugestões e percepções.

As únicas coisas de que tenho certeza são que talento sem disciplina e determinação é um ator em estado bruto e que o propósito interior está presente nos nossos cinco sentidos, fazendo dos olhos o espelho da alma.

quinta-feira, 17 de fevereiro de 2011

Entre Vertigens e Ibsen


Há um pouco mais de um semestre estou em um grupo de teatro estudando as peças simbolistas de Ibsen.

Os ensaios começaram há duas semanas e estamos pesquisando partituras de movimentos e aplicando-as em algumas cenas, que preparamos para apresentar ao grupo.

Cimos, fiordes, picos, topos, sótãos e altas construções. É nesse tipo de “relevo” ou “arquitetura” que os protagonistas de Ibsen transitam.

E nós, os atores, pesquisamos e utilizamos signos e símbolos para expressarmos essa ascensão e declínio dos personagens.

Solness, um dos protagonistas, é um construtor, faz grandes igrejas, mas tem medo de altura. Pois é, há uma semana estou em contato com este protagonista e pesquiso uma cena para apresentar.

Vejam a minha situação: logo eu, que nunca tive medo de altura, que sempre me aventurei pelos brinquedos mais altos do parque de diversão, que sempre quis pular de asa delta e que adoro morar no 15º andar, cá estou, com uma labirintite mestra, de molho, em casa, por causa de tamanha vertigem.

Solness e eu.

Será possível? Sempre consegui manter distância dos personagens, chorava com suas lágrimas, depois cessava. Ria com o seu riso e logo depois ficava séria. Coachava, Engrossava, Latia, Afinava, Cacarejava, Hablava... E depois tudo passava. Simples assim. Sem envolvimento...

E agora me encontro nesse estado, volta e meia grito achando que vou cair. Se eu levanto, tenho que sentar, se sento tenho que deitar e quando deito tudo roda.

CULPA DO SOLNESS, CULPA DO IBSEN.

Cadê meu “eixo” diretor? O tal eixo que “exercitamos” tanto na semana passada. Sentia-me livre para cair, pois sabia levantar (que bonito isso).

Solness está ao meu lado, esperando a Hilde provocante, a Hilde que o instiga a subir em suas construções. Ele gargalha da minha cara em letras garrafais, HAHAHA, e diz: “Logo você que recitava as falas de Hilde com tanta propriedade e nas alturas!” Pois é, eu sei, logo eu, que estava feliz porque faria a intrigante Hilde... Agora olho a minha imagem tortuosa no espelho e me vejo Solness.

Será possível que meu organismo tenha absorvido esse universo todo? Não estou falando de emoção! Não! Não é emoção. Não tenho vontade de rir, de chorar, de soluçar, não tremo, não me deprimo... São apenas tonturas, vertigens, vertigens de Ibsen.

A cada palavra digitada a visão fica embaralhada e depois volta ao normal. Quando olho para frente três homens me observam, em primeiro plano Ibsen e Solness e em segundo plano Artaud, sim o próprio, e ainda por cima (não muito em cima senão caio) eles tem um meio sorriso um tanto irônico no rosto.

Ai!

Além disso, (como pude esquecer de dizer isso?) ainda tem o Artaud de pano de fundo!
O livro “O ator e seu duplo” zomba de mim. Vai entender por qual razão não consigo chegar ao capítulo do Teatro da Crueldade. Já li duas vezes o livro até este capítulo e quando chego lááá (Pausa) não consigo continuar.
Perdi meus óculos e troco as palavras, as tonturas também deformam as palavras, mas Artaud, para quê palavras?

Estou sentindo, meu filho, sentindo!

O que acho interessante é todo esse estado físico... É orgânico! É como se meu corpo tivesse absorvido Solness, Ibsen, Artaud. E o resultado disso é a LABIRINTITE.

Nesse labirinto de peças, teorias, partituras e símbolos eu me encontro rodando, olho para tudo isso e caio gritando de susto. Assustada por ver o mundo girar, Assustada por nada estar ao meu controle.

Tomo então a minha pílula de “eixo” e finalizo o retrato das impressões de um processo fantástico de uma atriz em pesquisa.

segunda-feira, 7 de fevereiro de 2011

Então, me dá a deixa!

"Bater o texto" é um termo usado por atores para estudar o texto com o outro ator que está envolvido na cena. Dois atores ou mais lêem o texto para decorar as falas de seus respectivos personagens. Um ator chega em um teste e o produtor, diz: -Você fará a cena com Fulano! O ator que está com o texto em mãos, diz: Fulano, vamos bater o texto?

Iniciamos o blog com o intuito de "bater texto", porém no sentido mais amplo do termo, pretendemos analisar trechos de livros, relacionar teóricos de teatro, dialogar através de poemas e poetas, destacar falas da dramaturgia mundial, discutir o universo de dramaturgos e expor as nossas próprias ideias e teorias. Este conteúdo estará intrinsecamente ligado ao "mundo" do ator.

Todos os dias me deparo com atores. Atores que trabalham no teatro, televisão, cinema, ou então, atores que transitam por todos esses segmentos, e percebo que muitas são as aflições, dúvidas e teorias de cada um. Pois é... pode ter certeza de que estamos no mesmo barco. Então este é um espaço para trocarmos experiências.

Todas as críticas, opiniões, propostas de temas e discussões serão muito bem-vindas!

Nosso blog abre as portas não só para atores, mas para todos os comunicadores interessados em partilhar conhecimentos e informações.

Ensaiamos "um bocado" para iniciar o blog, pois os caminhos são muitos e nos confundem de tal forma, que não conseguimos organizar os pensamentos. Mas acredito que chega um momento que é necessário "se jogar", mesmo que seja assim, no susto, pois nunca estamos plenamente prontos, há sempre algo para mudar e aperfeiçoar. Aos poucos as ideias vão fluindo e se organizam na prática.
Este é apenas o início de tudo.
Que tal batermos o texto antes que as cortinas se abram?
Então, me dá a deixa?